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Empreender para mudar uma realidade


Você pode medir o sucesso de uma instituição pelo resultado que ela atinge nas vendas ou produção, entre outros fatores. Para nós do Campus Bento Gonçalves esse resultado é medido olhando para nossos ex-alunos. Quando em 1960 ingressou a primeira turma na Escola de Viticultura e Enologia de Bento Gonçalves, começava uma história que iria impactar em centenas de outras histórias.

Em 2018, coordenando um projeto de Extensão de divulgação de ações do campus, fui convidado para um evento em uma escola no distrito de Faria Lemos. Antes da minha fala uma egressa dos cursos técnico e superior de Viticultura e Enologia foi apresentar a vinícola de sua família. Mas sua fala não começou com a vinícola, mas na formação escolar e acadêmica que ela recebeu no Campus Bento Gonçalves. Havia uma paixão ao contar sua trajetória com evidente destaque ao seu tempo de aluna na antiga Escola Agrotécnica Juscelino Kubitschek. Ali estava uma história que foi impactada por nossa história.

Convidamos para nos falar um pouco desse período como estudante e a influência dessa vivência em sua carreira, a Enóloga e uma das proprietárias da Vinícola Cristofoli, Bruna Cristofoli.

 

Bruna, o que você guarda do tempo de estudante? Coisas boas, ruins, pessoas…

Eu comecei aqui em 2001 como estudante do curso Técnico em Viticultura e Enologia e fiquei até concluir o curso superior de Tecnologia em Viticultura em Enologia em 2007. Lembro muito de alguns professores, como o João Luiz Alexandre de Física. Acho que lembro dele porque deixava toda a turma em recuperação. Na Enologia lembro também da professora Maria Antônia e sua voz inconfundível. Das aulas no laboratório e os relatórios com a professora Giselle Ribeiro de Souza. Eu nem imaginava quando entrei aqui como era fazer um relatório, aquelas normas e tudo mais; eu tenho eles guardados até hoje, todos escritos à mão. Recentemente comecei a transcrevê-los para o computador, mas não estão ficando tão bons quanto os escritos.

A infraestrutura não era nem parecida com a que se tem hoje. A Biblioteca tinha um livro só para todo mundo, tenho cópias de todos os livros guardadas. Ou a gente fazia xerox ou não conseguia ler. Não existia bolsas de ensino, pesquisa e extensão. E a comida do refeitório não era boa. No almoço era arroz e feijão e no outro dia feijão e arroz; e na janta tinha um prensado com mortadela. Mas tenho também aquela saudade das amizades, do pertencimento a um grupo. Do apadrinhamento que era feito no início do ano com os calouros ou a viagem que fazíamos no 3º ano do técnico para Videira (SC) e Sant’Ana do Livramento ou do salsichão com pão que a gente fazia depois de juntar grana numa vaquinha.

 

O que representou vir para o Campus Bento Gonçalves naquele tempo?

Eu saí de Faria Lemos e vim para um lugar com gente novo, de culturas diferentes, de pensamentos diferentes. Gente dos mais diversos lugares. Vir para cá me mostrou outro horizonte. Mostrou um mundo maior do que o que eu conhecia.

 

Sua família já produzia uvas e vinhos, foi daí que veio a ideia de fazer o técnico em Viticultura e Enologia?

Eu sou a filha mais velha, então tinha uma pressão do meu pai para que eu me tornasse enóloga. Eu já sabia o que era pois conhecia enólogos formados aqui…

… e como foi voltar para casa com um conhecimento diferente daquele que seus pais tinham adquirido com a produção, digamos, tradicional?

Eu percebi que tínhamos práticas que em si não eram incorretas, mas eram incompletas. Então sim, entramos em rota de colisão. Mas é uma característica minha, ser persistente naquilo que almejo. Eu precisava perseverar naquilo. E isso é ainda mais evidente porque sou mulher. Olham para você e dizem: “tem nojinho não vai entrar ali”; você é sempre testada para provar que é competente naquilo que faz. Se acham que você tem um estereótipo de “lady”, já pensam: “não vai conseguir”. Hoje vejo como uma vantagem ser mulher, pois se torna um desafio ser líder, pois até a aparência física conta contra a mulher, então você precisa se impor para superar isso. Por isso defendo que há uma necessidade de constante renovação na indústria do vinho. Uma nova geração que precisa superar as barreiras e se fazer ouvir. Há um caminho longo pela frente, não basta que existam mulheres, é necessário existir mulheres na liderança, na frente. Mulheres e jovens.

 

Por fim, como você vê a importância do Campus Bento Gonçalves hoje para a região?

Ele é mais importante que antes. Influencia mais. São mais pessoas trabalhando e se formando aqui. Há mais cursos. É necessário se investir mais na Pesquisa e no Ensino, mas sobretudo na Extensão. A Extensão precisa fazer com que os egressos retornem atuem para melhorar a realidade do curso deles, assim como mudaram a realidade da propriedade ou negócio da família. Eu voltei para casa como Enóloga e decidida a mudar a realidade da propriedade da minha família, e junto com eles fizemos acontecer. É preciso existir um incentivo real ao empreendimento, mostrar para o estudante que ele pode voltar para a propriedade da família e mudar aquela realidade. O estudante do IFRS precisa ver que não é só o mercado de concurso público que existe, mas o do empreendimento. Precisamos inverter o sistema que pune quem empreende. Empreender reverte em recursos que vão parar na Educação por meio dos impostos. Então é necessário empreender e incentivar o empreendedorismo. Eu fui convidada para participar como conselheira na Aceleradora da Mulher Empreendedora da Federasul*. É um grande desafio, há gente super capacitada lá, mas é minha meta de vida “unir mulher e negócio”, e o que eu puder fazer para atingir esse objetivo eu vou fazer. O Campus Bento Gonçalves precisa pensar e investir nisso.

 

Durante a excelente conversa com a Bruna Cristofoli, ela citou dois livros que compartilho com vocês, pois também vejo como ótimas dicas para crescimento pessoal. O primeiro livro é “Faça Acontecer” (Companhia das Letras) de Sheryl Sandberg, que é a chefe operacional do Facebook. O segundo, “Linguagem Corporal para Mulheres” (Vozes) de Cornelia Topf. A Bruna também citou o aplicativo de smartphone, “12 minutos”, que é um aplicativo brasileiro de microbooks e audiobooks, com uma vasta biblioteca de livros de não ficção: empreendedorismo, psicologia, bem-estar etc.

A entrevista foi realizada por Daniel Clós Cesar, Técnico em Assuntos Educacionais, e atualmente lotado na Diretoria de Extensão do Campus Bento Gonçalves.

Site da Vinícola Cristofolli

*Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul.

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