Inclusão
Projeto de escola bilíngue para alunos surdos em Passo Fundo tem participação de pesquisadora e docente do Campus
Um passo importante pela inclusão e pelo reconhecimento da cultura surda está sendo dado em Passo Fundo. A cidade poderá receber uma escola bilíngue voltada a estudantes surdos – um projeto construído por educadores e ativistas da causa, com participação ativa da professora Andreia Mendiola Marcon, do Campus Sertão.
A docente integra o grupo que propõe a criação da escola bilíngue, formado pelo Núcleo de Estudos sobre Educação de Surdos (NEES), por professores da Escola Municipal Notre Dame, pela Associação de Pais e Amigos dos Surdos (Apas) e pela Associação Desportiva e Cultural dos Surdos de Passo Fundo (ADCSPF). No sábado (31), a proposta foi apresentada à comunidade, entidades, familiares e representantes do poder público de toda a região norte do Estado, no Centro de Eventos do Colégio Notre Dame de Passo Fundo.
O evento também contou com a mostra do projeto piloto “sala bilíngue” da Escola Municipal Notre Dame. “Após a matrícula de um estudante surdo, as professoras desta escola passaram a buscar conhecimentos sobre como alfabetizar criança surdas. Fizeram curso de Libras na Apas e o curso de Alfamãosear em Libras, projeto de extensão vinculado Campus Sertão”, conta Andreia.
A proposta
Segundo a professora integrante do NEES, Tatiane de Souza, o Núcleo atua desde 2008 na construção de alternativas para garantir uma educação que respeite a especificidades linguísticas e culturais dos estudantes surdos. A proposta da escola bilíngue é fruto de um trabalho coletivo envolvendo docentes das redes municipal e estadual, surdos e ouvintes, com a participação ativa da Apas, da Escola Municipal Notre Dame e apoio da ADCSPF.
O projeto prevê uma escola em que a Língua Brasileira de Sinais (Libras) seja a primeira língua dos estudantes e a Língua Portuguesa, a segunda. Além das disciplinas previstas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a grade incluirá conteúdos voltados à cultura surda, como artefatos históricos e temas identitários.
De acordo com a docente do Campus, Andreia Mendiola Marcon, a proposta está alinhada à Lei Nº 14.191, de 2021, que define que a educação de surdos é uma responsabilidade das redes de ensino e não da educação especial. “Essa lei reafirma o direito das crianças surdas a uma educação bilíngue em seus próprios espaços”, explica.
Desse modo, o objetivo da escola bilíngue é garantir o desenvolvimento da criança surda, considerando a sua identidade linguística e cultural. Na escola, a criança aprende Libras como primeira língua e língua portuguesa como segunda. Além de matérias regulares como matemática e ciências, o projeto prevê que a grade curricular da escola bilíngue aborde questões culturais do surdo e artefatos históricos voltados à identidade. Para a professora Monique Reveillau, integrante do Nees, “uma escola bilíngue deve atender a todas as normas da BNCC, seus componentes curriculares. O que muda é a inserção dos artefatos culturais da cultura surda, a cultura da libras e da língua adicional, a língua portuguesa”.
Andreia destaca que é fundamental contar com professores capacitados, incluindo docentes surdos. “A presença de professores surdos contribui para a representatividade e identificação dos estudantes, o que fortalece sua autoestima e pertencimento”, afirma.
Impacto para a região
A criação de uma escola bilíngue pode trazes avanços significativos na inclusão e no protagonismo da comunidade surda. “Essa iniciativa tem o potencial para abrir novas possibilidades de aprendizagem, inclusive incentivando outras Instituições a acolherem estudantes surdos em seus cursos, como o Campus Sertão. É o início de uma mudança de olhar para a cultura surda”, avalia Andreia. Para ela, o campus pode se tornar ainda mais parceiro do projeto por meio de ações de formação de professores.
Na sua opinião, “a educação de surdos não pode ser pensada apenas pela perspectiva da tradução de conteúdo. Precisa refletir e construir metodologia, abordagens culturais que levem em consideração o contexto da criança, possibilitando que os estudantes possam se tornar sujeitos críticos e autônomos”.
Andreia acredita que o impacto positivo será evidente assim que a escola estiver em funcionamento. “Precisamos ter espaço para mostrar que essa luta vale a pena”, reforça.
A participação de Andreia
No projeto, a professora Andreia atua como pesquisadora e colabora ouvinte, mas faz questão de enfatizar que o protagonismo é da comunidade surda de Passo Fundo. “Estou ao lado da comunidade, ajudando a dar visibilidade à causa. Minha atuação é atravessada por vários papeis: sou pesquisadora, professora, intérprete de libras, militante e mãe de uma menina surda. É isso que me move e que me faz lutar junto com a comunidade surda”, conclui.