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Educação intercultural: IFRS tem 85 estudantes indígenas em seus campi


No mês em que se comemora o Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas (7 de fevereiro), o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRS) relata ações desenvolvidas em apoio a esses povos. Atualmente, há cerca de 85 estudantes indígenas matriculados em cursos ofertados em 12 campi do IFRS. A previsão é de que outros 50 novos alunos ingressem ainda no primeiro semestre de 2023. 

Política de Ingresso Especial e Permanência do Estudante Indígena, aprovada em 2019, é uma forma de o IFRS contribuir com a luta pelos direitos desses povos. O documento procura assegurar o direito à educação e promover a interculturalidade como prática pedagógica. A partir dele, a instituição passou a realizar um processo de ingresso especial para estudantes indígenas, que oferta duas vagas extras em cada curso, o qual representa um olhar diferenciado aos candidatos. Devido a diferenças culturais, escolarização e isolamento geográfico de suas comunidades, esses estudantes costumavam concorrer em desvantagem no processo de ingresso regular de alunos, o qual também prevê reserva de vagas para indígenas, conforme a Lei de Cotas (12.711/12).

Um dos resultados da Política foi o crescimento significativo do número de indígenas matriculados: de seis, no ano de 2018, para 85, em 2022. São Guaranis, Kaingangs, Anhetenguá-Guaranis e Mbyá-Guaranis, que fazem cursos técnicos e superiores em 12 diferentes campi. Neste ano, com a quinta edição do Processo Seletivo especial, cerca de 50 novos indígenas devem passar a estudar na instituição,

O IFRS conta ainda com a Assessoria de Relações Étnico-Raciais, para fortalecer e gerenciar ações de promoção à igualdade, à inclusão e à diversidade de raça e etnia. Conforme a assessora, Alba Cristina Couto dos Santos Salatino, a intenção é incluir os estudantes indígenas motivando a diversidade étinico-racial e a interculturalidade em todos os espaços do IFRS, pois é por meio de uma educação que respeita e valoriza a pluralidade que se pode transformar a realidade e combater as discriminações. “A presença de indígenas no IFRS nos provoca a pensar numa educação libertadora, emancipadora, intercultural para todos os outros estudantes, pois todos crescem com as diferenças”, comenta Alba.

O pró-reitor de Ensino, Lucas Coradini, acrescenta que o próximo passo é pensar em projetos pedagógicos em parceria com os indígenas, com cursos dentro das aldeias. “Dessa forma, eles poderão manter ao máximo o vínculo com suas comunidades, sua organização social ou familiar.” Segundo Lucas, deve ser analisada uma nova proposta pedagógica que faça interlocução com os saberes indígenas, tendo inclusive professores indígenas atuando nos cursos.

 

Para multiplicar os conhecimentos

 

Para Ana Clevia dos Santos, 21 anos, aluna da Licenciatura em Ciências Biológicas, e Samoel dos Santos, 27 anos, do técnico em Comércio na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA), o IFRS representa a conquista de novas oportunidades. Ambos estudam no Campus Sertão e são Kaingang da aldeia de Cacique Doble. Dos cem moradores da aldeia, dez são estudantes do Campus Sertão.

Após concluir o curso, Ana pretende ajudar na formação das novas gerações indígenas, atuando na escola da aldeia, que atende até o 9º ano do ensino fundamental. “Foi uma boa escolha buscar uma oportunidade no Campus Sertão. Considero uma ótima instituição, com professores qualificados, e ainda posso ficar perto da minha família.” No período de férias, Ana retorna à aldeia e ajuda na produção de artesanato, como balaios, filtros dos sonhos e bijuterias.

Fotografia de Samoel.

Samoel: “O IFRS me fez voltar a sonhar”

Samoel faz planos de cursar veterinária. “Me acolhendo neste retorno aos estudos, o IFRS me fez voltar a sonhar”, conta ele, que atualmente trabalha em uma empresa de rodovias. “O que aprendo no curso técnico em comércio estou implementando para melhorar a venda de nosso artesanato e também os produtos da nossa medicina natural”, explica. Samuel mora com a esposa e está à espera da primeira filha, que deve nascer ainda no mês de fevereiro.

 

Já Dalvinha Antonio Reis, 18 anos, estudante da Licenciatura em Ciências Biológicas em Sertão, é do acampamento indígena Nēn Mág. Apesar de ser de outra comunidade, tem planos semelhantes aos de Ana: pretende se especializar para lecionar em alguma escola indígena.

 

Preservação da cultura

 

Fotografia de Patrine Farias,. Ela aparece com o rosto pintado e cocar.

Patrine: “Estou preparada para conquistar meu espaço”

Na Terra Indígena Ligeiro-Charrua moram cerca de 1.500 pessoasAlguns jovens da aldeia também frequentaram ou frequentam o Campus Sertão. Um deles é Patrine Farias, 18 anos, aluna do técnico em agropecuária. Durante o período de aulas, é residente do campus, mas retorna à sua comunidade nos finais de semana e feriados, onde mora com a mãe e dois irmãos. Quando está na aldeia, ela aplica o que aprendeu em aula na horta da família.

Tenho medo de perder minha língua materna, mas também quero estudar e trazer novos conhecimentos para a aldeia. Sei que isso requer esforço, ficar fora da aldeia lidando com outro público é complicado, mas estou preparada para conquistar meu espaço”, observa. “O IFRS tem sido essencial para o meu futuro! Acredito que o instituto está me preparando para o mundo.”

A assessora de relações étnico-raciais do IFRS comenta que os povos indígenas estão se organizando com uma agenda política e buscam se fortalecer nos próprios grupos étnicos pela conservação da cultura. “Eles querem e estão contando as suas próprias histórias que foram negadas, silenciadas por muito tempo. Essa consciência étnica e a luta por cidadania e reconhecimento de suas culturas com certeza vai refletir dentro dos espaços do IFRS”.

O professor do Campus Viamão Carlos Robério Garay Correa atua em projetos voltados a comunidades indígenas e acredita que o momento atual é de esperança para esses povos. “Precisamos avançar na formulação e na consolidação de políticas, na garantia desses grandes eixos das lutas dos povos indígenas, da demarcação de terra, da preservação da cultura e na luta por direitos fundamentais.”

Robério relembra a atividade realizada com as lideranças de cinco comunidades indígenas durante o 7° Salão de Pesquisa, Extensão e Ensino do IFRS, evento ocorrido em novembro de 2022, com a participação de caciques. “O evento é indicativo de um período que devemos ter muito presente, que é avançar para além da oferta das vagas e da permanência dos estudantes na instituição tal qual está estruturada hoje, mas em uma verdadeira inclusão que considere a preservação da cultura.”

Alba salienta ainda as boas expectativas em relação aos estudantes que já ingressaram e afirma: “É um orgulho para o IFRS tê-los entre nossos estudantes, contribuindo com suas presenças e saberes para uma formação cidadã, inclusiva e plural.” Essa diversidade é estendida ao mundo do trabalho e a outros espaços da sociedade a partir da formação e inserção desses estudantes, se assim desejarem.

 

Sobre o dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas

 

A data, 7 de fevereiro, foi escolhida em virtude da memória do falecimento de Sepé Tiaraju, líder indígena que comandou os guaranis durante a Guerra Guaranítica, em 1756, travada contra portugueses e espanhóis. O conflito foi decorrente das alterações feitas pelo Tratado de Madri (1750), que impactavam diretamente na vida dos índios, sem que os mesmos tivessem sido consultados a respeito delas. Sepé é conhecido por sua marcante frase defensora dos direitos indígenas “Esta terra tem dono”.

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