Campus Viamão
Projeto Afrocientista inspira pesquisa sobre permanência de estudantes negros no ensino superior
A trajetória de Thainá Rocha Motta no Campus Viamão do Instituto Federal (IFRS) não foi apenas acadêmica. Foi também política, afetiva e transformadora. Aos 26 anos, a estudante do curso de Tecnologia em Processos Gerenciais concluiu sua graduação defendendo um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) diretamente influenciado por sua vivência no Projeto Afrocientista — uma iniciativa da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN) desenvolvida em parceria com o campus.
O projeto, que promove o ingresso e a permanência de jovens negros na pesquisa científica, ampliou o olhar de Thainá sobre as desigualdades na educação. O tema que escolheu investigar sintetiza essa experiência: “Políticas de permanência e êxito: uma análise da ação da gestão escolar diante da evasão de discentes autodeclarados negros dos cursos superiores do IFRS Campus Viamão”. A pesquisa foi orientada pela professora doutora Alba Cristina Couto dos Santos Salatino e pelo professor doutor Nilo Alves Barcelos.
Durante o percurso acadêmico, Thainá atuou também como estagiária no setor administrativo do campus. Essa posição dupla — estudante e servidora — permitiu que ela observasse, com sensibilidade e criticidade, a ausência de colegas negros ao longo dos semestres. Decidiu então escutar suas histórias: entrevistou dez ex-estudantes que evadiram dos cursos de Gestão Ambiental e Processos Gerenciais entre 2017 e 2023.
“Eu comecei a andar pelos corredores e via que os meus colegas negros não estavam mais ali. Fui percebendo que algo estava errado. Por que a gente não permanece?”, relata Thainá, ao explicar o ponto de partida da pesquisa.
Entre os principais fatores relatados estão as dificuldades de transporte, a sobrecarga de responsabilidades familiares, a falta de acessibilidade e a desconexão entre o currículo e as vivências dos estudantes. A pandemia e os impactos da crise climática no Rio Grande do Sul também foram apontados como agravantes no abandono dos cursos.
A experiência no Projeto Afrocientista contribuiu diretamente para a construção do trabalho. Thainá participou da coordenação de oficinas, promoveu debates sobre identidade e negritude e integrou a criação de uma peça teatral com estudantes da Educação Básica. O projeto também a conectou com uma rede de pesquisadoras negras e impulsionou sua consciência política.
“Eu me tornei uma pessoa muito mais forte, muito mais crítica, muito mais consciente da minha identidade e do meu papel. O projeto me deu base, me deu coragem e me deu voz.”
Para Thainá, representatividade importa — e pode mudar trajetórias. “Ter uma professora negra como orientadora fez toda a diferença. A professora Alba me mostrou que eu tinha lugar naquele espaço, que eu não precisava pedir licença para existir ali. Isso me deu força para querer ser também uma referência para outras meninas negras.”
Thainá destaca ainda o papel fundamental da ABPN na sua formação acadêmica e pessoal:
“A ABPN me deu estrutura. Me fez sentir parte de algo maior. Saber que existia uma rede de pesquisadores negros espalhados pelo Brasil foi essencial para eu entender que eu não estava sozinha.”
Com o diploma em mãos, Thainá pretende agora ingressar no mestrado em Políticas Públicas. Sua pesquisa de TCC é também um chamado: por políticas institucionais de permanência que considerem as desigualdades raciais e sociais dos estudantes da educação pública.
Com informações da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN): abpn.org.br/afrocientista-thaina-rocha-motta-defende-tcc-sobre-evasao-de-estudantes-negros-e-afirma-o-projeto-mudou-a-minha-vida